Diário de Transbordo - Parte X: Niños que marchan

Dolores levantou às quatro da manhã , vestiu sua calça mais velha, a blusa mais surrada, lavou o rosto para afastar o sono, e saiu cortando o vento rumo à estação de trem.
No vagão, os bêbados cantavam a noite perdida. A janela ia revelando uma paisagem cada vez mais cinza: muros grafitados, casas que ameaçavam desabar, árvores sem folhas.
Pensava onde esconderia seu estrangeirismo quando se juntasse à marcha de operários que caminhavam há doze dias rumo à capital da Cidade do México, para reivindicar melhores condições de emprego e a destituição de um governador tirano.
Havia recebido recomendações explícitas de que deveria fazer uma cobertura imparcial, isenta, sem emotividades - atributos esperados de qualquer repórter. Sabia que não conseguiria obedecer à orden castrativa, mas precisava do emprego.
Não pelo capital, que esse ela sempre arranjava um jeito de arrumar, mas porque lhe fascinava a idéia de que alguém lhe estivesse pagando para pintar papel com idéias.
Quando chegou em Chalco, umas das zonas mais miseráveis do país, ouviu a voz de Teresa:
- Eu gosto daqui. Esse lugar é tão feio, tão feio, tão feio, que as pessoas são mais bonitas. E isso só acontece quando falta o que falta.
Teresa correu aflita em direção ao rio de gente de pés calejados e chapéu de palha. Ebarrou em mastros de bandeiras vermelhas, sacos de ração
alimentar e em cães que disputavam com os manifestantes em número, fome e atenção.
Enquanto esperava que Teresa encontrasse o que estava buscando, Dolores deixou-se levar pela multidão, embalada por histórias de luta e resistência dos operários da Assembléia Popular de Oaxaca. Se desesperou ao ter a certeza de que não conseguiria escrever nenhuma linha sem manchar o jornal com seu sangue latino.
Quando já estava decidida a trocar o gravador por uma bandeira, avistou Teresa marchando, aos pulos, no olho da multidão .
Guiava em sua direcao um pequeno, como se carregasse uma coroa lapidada de diamantes.
- Quem é esse menino, Teresa?
- É a sua reportagem, Dolores. Agora você só precisa pintar ele no papel.
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A reportagem:
(Ao camarada Pardiñas, pela fome compartilhada)
Chalco, 8 de outubro de 2006.
2 Comments:
Me faz lembrar as marchas dos sem-terrinha, as crianças das escolas do MST.
Que possamos nois inspirar neles, nos miúdos, nos erês, nos curumins, para continuar a luta em terreno tão adverso.
Feliz dia das crianças para todos nós!
Com saudades e em fraternura,
Mauro
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